A atual novela das sete da Globo não vem dando os resultados de audiência que a emissora almejava. Afinal, houve um grande investimento em Deus Salve o Rei e uma campanha que nenhuma outra novela teve. Porém, a trama está longe de ser um fracasso. Tem alcançado em torno de 25 pontos no Ibope, cerca de três pontos a menos que o sucesso Pega Pega e praticamente o mesmo índice da elogiada Rock Story. A verdade é que o caso da insossa novela sobre o roubo ao Carioca Palace foi uma exceção. O ”normal” é a faixa atingir mesmo os números que o enredo medieval vem dando ou então uns dois pontos a mais quando o folhetim está com muito êxito. Porém, já começaram a intervir no roteiro de Daniel Adjafre, dirigido por Fabrício Mamberti.

Alguns capítulos foram reescritos para dar mais dinamismo no enredo, procurando focar apenas nos conflitos de Amália (Marina Ruy Barbosa), Afonso (Rômulo Estrela), Catarina (Bruna Marquezine), Rodolfo (Johnny Massaro) e Lucrécia (Tatá Werneck), dispensando o foco em situações paralelas. Até então eram mudanças aparentemente pontuais e até naturais, pois a história da novela realmente carece de maiores acontecimentos e muitas vezes se mostra modorrenta. Não é uma trama ruim, mas apresenta problemas no desenvolvimento, expondo uma ausência de dramas convidativos. Bastaria uma alteração em torno do núcleo central, promovendo mais viradas.

No entanto, a situação se mostrou mais ”grave” do que se imaginava. Isso porque Silvio de Abreu (responsável pelo setor de teledramaturgia da Globo) colocou Ricardo Linhares para interferir em Deus Salve o Rei e não se sabe o quanto o escritor mexerá no roteiro de Adjafre. O grande mistério nisso tudo é a insistência em selecionar Ricardo para “salvar” folhetins problemáticos.
O último que contou com a interferência do autor foi A Lei do Amor, fracassada história de Maria Adelaide Amaral e Vincent Villari, exibida em 2017. E a experiência se mostrou uma catástrofe. Ele simplesmente terminou de aniquilar o que já estava bastante equivocado. Vários personagens morreram gratuitamente ou sumiram sem maiores explicações, enquanto os conflitos continuaram rasos e desinteressantes. O resultado nos números de audiência foi irrelevante.

Além dessa experiência nada agradável, é preciso constatar um fato: Ricardo Linhares nunca emplacou uma novela de sucesso escrevendo sozinho. O seu trabalho merece total respeito, assim como sua carreira, sendo colaborador de vários autores, especialmente Aguinaldo Silva e Gilberto Braga. Ele escreveu com o primeiro folhetins inesquecíveis, como Tieta (1989) e Pedra sobre Pedra (1992), além de tramas não tão boas como Fera Ferida (1994), A Indomada (1997) e Porto dos Milagres (2001). Já com o segundo colaborou com a fracassada O Dono do Mundo (1991) e as ótimas Anos Rebeldes (1992), Celebridade (2003) e Paraíso Tropical (2007) – aí já ganhando o título de co-autor, repetido na fraca Insensato Coração (2011) e na catastrófica Babilônia (2015). Ou seja, participou de sucessos e fracassos sendo parceiro de outros escritores.

Já escrevendo sozinho não foi feliz em nenhuma produção. Meu Bem Querer, exibida em 1999, foi uma novela insossa e problemática, marcando negativamente a sua estreia como autor solo. Até Marília Pêra, intérprete da vilã Custódia, pediu para sair da novela, insatisfeita com os rumos da personagem. A audiência também não correspondeu e foi um trabalho para ser esquecido.

Em 2003, Ricardo ganhou uma nova missão: escrever uma trama das seis. Novamente fracassou. Agora é que são elas foi um folhetim que enfrentou sérios problemas de audiência, enfrentando uma forte rejeição do público. Várias mudanças foram feitas ao longo da história, que chegou a melhorar, mas sem conseguir reverter o resultado perante o telespectador. Nem mesmo a aposta em Miguel Falabella (Juca Tigre) e Marisa Orth (Vanvan) como um casal divertido, apoiando-se no sucesso de Caco e Magda do Sai de Baixo, surtiu efeito. Após mais esse fracasso, o autor foi recolocado como colaborador.

Em 2013, porém, ganhou outra chance e ficou com a responsabilidade de escrever o remake de Saramandaia, um dos maiores marcos da teledramaturgia nacional. Infelizmente, acabou sendo mais uma experiência equivocada. O autor não conseguiu prender a atenção do telespectador, tropeçando em um ritmo lento demais e conflitos que pouco empolgavam quem assistia.

O realismo fantástico, uma das maiores identidades desse inesquecível enredo de Dias Gomes (exibido em 1976), só começou a ser explorado de fato depois da metade da história e já era tarde demais. A trama amargou uma média de 15 pontos na faixa das 23h e não deixou saudade quando chegou ao fim, além de não ter marcado a carreira de nenhum ator que participou do enredo, nem mesmo Sérgio Guizé vivendo o famoso João Gibão. Um remake que não deu certo.

Recentemente, o autor produziu Se Eu Fechar os Olhos Agora, minissérie baseada no livro homônimo de Edney Silvestre, cujas gravações já foram finalizadas. Ainda não há previsão de estreia, mas cogita-se janeiro de 2019. Toda sorte para ele e que venha um sucesso. Todavia, com todas as produções mencionadas, é fato que colocar Ricardo Linhares para “salvar” uma novela acaba provocando um inevitável questionamento.

Deus Salve o Rei tem problemas de roteiro, mas não fracassou na audiência e sua história tem um bom potencial. O próprio Daniel Adjafre poderia se responsabilizar em mexer no seu roteiro com o intuito de provocar novos conflitos, sem a necessidade de um outro autor interferir. E se é para ter o auxílio de alguém, seria mais lógico selecionar um colega com mais experiência em tramas de sucesso. Resta aguardar, então, o resultado das tão mencionadas “mudanças” e se surtirão algum efeito positivo.


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Sérgio Santos é apaixonado por TV e está sempre de olho nos detalhes. Escreve para o TV História desde 2017 Leia todos os textos do autor