Se alguém me falasse em janeiro que teríamos um jogo da seleção brasileira exibido pela TV Brasil com exclusividade, eu teria sido o primeiro a pedir para que essa pessoa fosse para o hospício mais próximo. Mas 2020, esse ano tão estranho e inesperado, fez com que até essa quase utopia virasse realidade na noite de terça (13).

E foi justamente essa transmissão inusitada que trouxe um debate pertinente de volta. Afinal de contas, quem tem mais a perder nessa guerra pelos direitos de transmissão dos mais diversos clubes: a Globo, líder de audiência, ou os clubes e a Seleção Brasileira?

Na verdade, a resposta pra essa questão é bem mais complexa do que parece e demanda a análise de vários outros pontos. Telespectadores, alcance dos veículos, visibilidade de patrocínios, qualidade técnica… Vamos tentar dissecar ponto a ponto a ponto, sem que isso vire um TCC.

Telespectadores: durante muitos anos, o público do futebol sabia que encontraria quase todos os jogos de todas as competições nos veículos do Grupo Globo. Agora, eles estão fragmentados entre os canais da Turner, Band, SBT, plataformas on demand e, agora, até mesmo na TV Brasil. Se antes era fácil saber onde assistir o seu time, agora a tarefa exige planejamento e, em muitas vezes, dinheiro.

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Alcance: dificilmente algum outro veículo nacional tem a mesma penetração que a TV Globo. No caso de terça, a atitude da TV Brasil é louvável, afinal, o jogo só seria transmitido para usuários pagantes de duas plataformas se não fosse a atitude do canal governamental. O alcance menor, porém, gera um incômodo bem grande no fator seguinte dessa equação.

Patrocinadores: ninguém quer pagar para ter o seu produto visto para as paredes. Três pontos de média é um número histórico e expressivo para a TV Brasil, mas é um índice irrisório para a Globo, que tem marcas superiores até nas madrugadas. O alcance menor, consequentemente, tende a diminuir os valores pagos para anunciar nos eventos esportivos.

Qualidade técnica: gostem ou não da Globo, a sua qualidade é impecável até nos locais mais remotos do país. A emissora tem capacidade de transmitir e produzir eventos de maneira ímpar em qualquer lugar, graças ao seu know-how adquirido em décadas de trabalho. Os demais canais, por mais esforçados que sejam, ainda deixam a desejar em vários pontos.

Dia desses, o Chico Barney disse que o esporte favorito do brasileiro não é o futebol. É assistir à TV Globo. E ele não está errado: de sexta (9) para ontem, quase cinco milhões de telespectadores — apenas na Grande São Paulo — se esqueceram da existência da seleção brasileira, que é quase uma instituição nacional.

Sem a transmissão da partida, a rede da família Marinho permaneceu na liderança com a sua grade habitual. O público não abriu mão do Jornal Nacional e da novela das nove para acompanhar Neymar e os demais jogadores comandados pelo técnico Tite.

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A audiência da TV Brasil foi, incontestavelmente, histórica. É um canal nanico, que raramente passa de meio ponto na principal metrópole do país, e que boa parte da população sequer sabia como sintonizar. Além disso, vale lembrar que a transmissão do jogo só foi anunciada pouco antes das 20h, ou seja, uma hora antes da partida.

A Globo, cada vez mais, tem se mostrado menos dependente dos eventos esportivos e mostrou que tem uma grade de programação consolidada. Os anunciantes, por sua vez, terão que se acostumar com a nova e difícil realidade: a emissora líder não está mais disposta a investir milhões de dólares para monopolizar os torneios.

Com a fragmentação dos direitos, o mercado irá pagar cada vez menos para anunciar na camisa dos times e nos estádios. É uma equação simples: menos público, menos lucro. E a fragmentação dos direitos também causa um impacto direto no bolso do fã de futebol, que tem que gastar cada vez mais para assistir aos jogos.

Por enquanto, a Globo e os clubes dão sinais de que o distanciamento tem sido bom pra ambas as partes. Mas para você, telespectador e torcedor, a minha recomendação é bem simples: pegue papel e caneta pra conseguir anotar o calendário de quem transmite o que e quando.

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