Até aqui, acompanhei todos os capítulos de Um Lugar ao Sol. Porém, tenho encontrado dificuldade. Para cada dia, precisei verificar na internet o horário de exibição da novela. Acho que é a primeira vez que isso acontece. Os jogos de futebol tem bagunçado a grade noturna da Globo. Assim não há audiência que se sustente! Novela é hábito: segurar o público com uma história envolvente a cada dia, no mesmo bat-horário, no mesmo bat-canal.

E a audiência? Está baixa: média de 22, 23 pontos no Ibope da Grande SP. Foram as menores primeira e segunda semanas entre as novelas das 8/9 da Globo. Vários fatores devem ser considerados. Não há dúvida de que o horário incerto é um deles. Também os momentos decisivos de Gênesis na Record – quando aconteceu de concorrer diretamente com Um Lugar ao Sol, claro!

Mas não creio que a concorrência seja determinante na baixa adesão à novela da Globo na TV aberta.

Por outro lado, Um Lugar ao Sol está sempre entre os programas mais vistos do Globoplay. E, nas redes sociais, a repercussão é imensa, com elogios rasgados à produção.

O fim de ano de 2021 chega com o relaxamento das restrições à pandemia, dando uma falsa impressão de “fim de covid” e volta à normalidade, o que faz as pessoas quererem recuperar o tempo perdido com as limitações impostas desde abril de 2020. Está todo mundo com sede de sair, encontrar pessoas, viajar, se divertir.

Novela nova precisa “pegar” para gerar fidelização. Fica difícil quando a atração anterior não era um grande sucesso (reprise de Império). Mais ainda se é exibida a cada dia em um horário diferente.

Há negligência da emissora com a produção? Pode até ser. Mas a Globo calcula todos os riscos e sabe que está estreando uma produção no fim de ano, em um momento em que as pessoas não aguentam mais ficar em casa assistindo TV – porque estão há mais de um ano e meio fazendo isso.

Na realidade, Um Lugar ao Sol cumpre o papel de tapa-buraco, para que o próximo lançamento, Pantanal – a grande promessa da emissora para 2022 -, estreie com folga e sossego.

Tanto que a novela de Lícia Manzo vai cobrir justamente o período mais difícil para a TV em qualquer tempo e época: festas de fim ano, verão e carnaval.

Enquanto isso, sigo curtindo muito este tapa-buraco.

Destaques da semana

– Até aqui, a novela tem se mostrado bastante dinâmica, com muitos acontecimentos e desdobramentos, em um ritmo até acelerado. Ou seja, se você perdeu um capítulo, perdeu muito. E os ganchos, cada um melhor que o outro!

– Em todo capítulo, há um diálogo bonito, confortante, reflexivo. Deixo como exemplo a conversa entre Lara e Noca em uma viagem de ônibus:

Lara: “Acho que é na estrada que me sinto melhor. Eu sei que tem gente que até mora aqui, mas a estrada pra mim não chega a ser um endereço, um lugar. Ela é mais um caminho. A estrada é uma coisa que a gente atravessa quando ainda não chegou em canto nenhum.”

Noca: “Eu sei que você está em uma travessia aí dentro de você. Mas daqui a pouco você vai chegar no seu destino. Pensa no quanto você já caminhou!

– Bonitas as cenas em que Dalva (Ju Colombo) relata a Noca (Marieta Severo) o incômodo pela neta sentir-se constrangida com sua presença na sala de aula, como aluna. Noca conversa afetuosamente com a menina e ela escreve uma redação para a avó. São situações que até soam irreais (poderia haver um desenvolvimento maior), mas que não são exatamente uma trama a ser desdobrada na novela (a neta com a avó).

Trata-se de um adendo que serve como alívio às tramas mais pesadas ou de carga mais dramática. Como se fosse um alívio cômico, mas que não é cômico. É um recheio que dá um “quentinho no coração“. Aliás, uma característica do texto de Lícia Manzo.

– Muito boa a cena em que Elenice (Ana Beatriz Nogueira) conhece Alípio (Ísio Ghelman) no avião. Parece que temos pela frente um bom envolvimento entre dois trambiqueiros. Será? Acho que pode render.

Alinne Moraes é um dos maiores destaques do elenco, excelente como a mulher em relação tóxica que sofre da dependência afetiva de um homem. Renato, muito canalha, aproveita-se conscientemente da condição dela. O Renato anterior (o verdadeiro) era inconsequente e imaturo – ela reagia de uma maneira. O atual percebe e fomenta essa situação – ela sente que o amado “mudou” e suas reações a esse novo perfil são outras, mas não menos problemáticas.

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– Também gosto muito de Andrea Beltrão. Há uma leveza em sua personagem, apesar do drama que Rebeca vive, também em uma relação desgastada com o marido e todas as questões com a idade. A cena com a mãe na casa de repouso (participação luxuosa de Débora Duarte) foi muito bonita.

– Sei que muitos torcem o nariz para o envolvimento de Ravi e Joy. Mas a garota representa o caos na vida do rapaz centrado, o que gera ótimas possibilidades, como a gravidez dela concomitante à gravidez de Bárbara. Por mais caótica que Joy seja, ela e seu filho representam o porto seguro onde Ravi vai se ancorar com toda garra, a família que ele nunca teve.

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– A novela mais de uma vez exibiu sequências que confrontam tramas e personagens de classes sociais opostas, demarcando bem as duas realidades. Nesta semana, foram os partos de Bárbara e Joy, que aconteceram ao mesmo tempo e as cenas foram mostradas alternadamente. Muito engenhoso o entrecho que fez com que Renato não estivesse presente no parto de seu filho, mas presente no parto do filho de Ravi, enquanto este levava Bárbara para o hospital.

Por um momento pensei 1) que as crianças seriam trocadas (!) 2) que Santiago fosse pedir o filho de Ravi para colocar no lugar do bebê natimorto de Bárbara. Bem, seria outra história, outra novela – aliás, já vista, várias vezes.

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Desde criança, Nilson Xavier é um fã de televisão: aos 10 anos já catalogava de forma sistemática tudo o que assistia, inclusive as novelas. Pesquisar elencos e curiosidades sobre esse universo tornou-se um hobby. Com a Internet, seus registros novelísticos migraram para a rede: no ano de 2000, lançou o site Teledramaturgia, cuja repercussão o levou a publicar, em 2007, o Almanaque da Telenovela Brasileira. Leia todos os textos do autor